segunda-feira, 20 de julho de 2015

Uma questão de Orgulho


Eu nunca havia participado da parada do orgulho LGBT, mas esse ano decidi que iria até mesmo sozinho se preciso fosse. Sorte a minha encontrei outra ovelha negra perdida do rebanho atrás de companhia pra participar do evento, a linda da Sofia Coeli, responsável pela maioria das fotos deste post.

Alguns de vocês podem dizer:

Mas Marcos, com esse montão de amigos gays, lésbicas, bis e trans que você tem, ainda estava achando que teria de ir sozinho para a parada? Bixa, menas.

Pois é. Estranho né? Quando o casamento igualitário foi aprovado em todo o território dos EUA a maioria esmagadora dos meus amigos participou da campanha “Celebrate Pride” e colocou o filtro colorido na foto de perfil, foi lindo. Fiquei emocionado por uns dias com essa onda de amor, aceitação e orgulho da diversidade. Mas de forma irônica, na medida em que o dia da 18ª Parada do Orgulho LGBT de BH ia chegando, eu fui percebendo a falta de repercussão que esse evento tinha no meu ciclo de convívio e amizades. E gente, meu ciclo de convivência é coloridíssimo, viu? Nem mesmo um comentário do tipo: “A parada é esse final de semana, você viu? ” Ou quem sabe um convite para ir junto. Nada mesmo, uma reticência completa sobre o assunto.


Fiquei pensando no evento que funcionou como gatilho para o movimento do orgulho LGBT em 1969 e percebi que, diferente do momento da rebelião de Stonewall em NY, a principal forma de opressão que sofremos hoje em dia não vem do conflito direto e físico com a polícia, por exemplo. (Apesar desse tipo de violência ainda existir, com mais frequência do que imaginamos. Veja o caso da morte da Laura Vermont, que tem como principais suspeitos dois policiais: http://goo.gl/2vouw3 ). A opressão e as ameaças que sofremos hoje são mais sutis. Sinto que a pauta do movimento LGBT, como um todo, passou pela exigência de aceitação e agora batalha pelo respeito. Saímos do armário, não temos mais que nos esconder. Essa é uma vitória incrível, e devemos a todos e todas que lutaram no passado para que pudéssemos ter essa liberdade hoje, para que fôssemos aceitos.

Mas a aceitação que conquistamos está longe, MUITO LONGE, de respeito. E respeito é algo que, definitivamente, nós não temos. Não somos respeitados em praticamente nenhuma das esferas sociais, e é essa a nossa luta hoje. Talvez por isso meu facebook tenha ficado multicolorido durante a campanha Celebrate Pride, mas foi tão difícil cruzar com rostos amigos na multidão de 30 mil pessoas que lotou a praça da estação no domingo à tarde.




A Rebelião de Stonewall deu origem à um movimento de ORGULHO. E muitas pessoas não entendem muito bem o que esse termo significa. Afinal de contas, orgulho pode ser aplicado tanto como um sentimento de capacidade e satisfação pessoal como também um sentimento de arrogância ou soberba. Picuinhas do nosso idioma multifacetado. Mas o que ninguém se lembra é que o antônimo desse termo é claro, simples e não tem dupla interpretação: VERGONHA.

“ Vergonha é uma condição psicológica e uma forma de controle religioso, político, judicial e social, consistindo de ideias, estados emocionais, estados fisiológicos e um conjunto de comportamentos, induzidos pelo conhecimento ou consciência de desonra, desgraça ou condenação. “
 Wikipédia

Vergonha é uma coisa pesada, né? Consciência de desonra, desgraça e condenação. Se você, leitor, é heterossexual, talvez não entenda muito bem o peso que essas palavras carregam. Mas se você, assim como eu, se enquadra dentro da sigla LGBT ou dentro de algum dos seus aspectos de alguma forma, você sabe exatamente do que eu estou falando.



Desonra, desgraça e condenação são conceitos que assombram todos LGBT’s antes e depois de sair do armário. E é preciso muita coragem e força para aos poucos deixar essa vergonha de lado e aprender a ter orgulho de si mesmo. É por essas e por outras que abominações como a página “Orgulho de ser hétero” não fazem o menor sentido.

E é justamente porque é preciso vencer toda essa vergonha imposta, que nós, LGBT’s, precisamos exercitar o nosso orgulho diariamente. E se existe algo que ajuda e muito nesse sentimento é a noção de comunidade. Ver nossos amiguinhos colorindo a foto de perfil é delicioso. Acalenta até os corações mais frios. Mas ver toda essa gente unida, em um mesmo lugar, com um mesmo propósito, é mil vezes mais emocionante.



Nesse movimento que clama por respeito, ousar existir, botar a cara no sol e exigir muito mais que aceitação é a mais militante de todas atitudes. Participar da parada tem um significado muito maior do que se pensa. Participar da parada é reconhecer todos os direitos que já foram conquistados com muita luta e sofrimento mas perceber que ainda falta MUITO, mas MUITO MESMO, para que a sonhada igualdade seja alcançada. Malafaias, Bolsonaros, Felicianos, Cunhas e outras aberrações políticas estão aí para provar isso.

E é justamente por isso que participar da parada é sim, um ato político. E não é preciso nem levar cartaz com palavras de ordem (mas pode sim!), basta encontrar lá dentro de você aquilo que te define como quem você é de verdade, colocar esse seu eu para fora e desfilar ele, cheio de orgulho, sambando na cara de uma sociedade que há algumas décadas percebeu que você existe, mas ainda teima em torcer o nariz quando passa.


Fotos por Sofia Coeli.

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